Por Betty Milan - psicanalista e colunista da Revista Veja.
Matéria publicada na edição nº 2237 - ano 44 - nº 40 em 05/10/11
"Tratar o corpo dos mortos para conservá-lo até a incineração, ou o
sepultamento, é uma prática antiga e comum a todas as grandes
civilizações. Na era contemporânea essa prática, a tanatopraxia, está
mais disseminada nos países de cultura anglo-saxão do que nos de cultura
latina. No Brasil, ela é pouco conhecida, certamente por causa do tabu
da morte.
O tanatopraxista tanto pode se encarregar do preparo simples do corpo
quanto de sua conservação. Ele também pode restaurar um rosto deformado
por uma enfermidade ou fazer o molde de uma face. Precisa ter
conhecimentos de anatomia, fisiologia e psicologia. Sua profissão é
considerada artística.
Cuidar da pessoa amada depois de morta é indício de grande respeito a
ela. E recorrer ao tanatopraxista faz bem também para a família, já que
estabelece uma continuidade entre o momento da morte e o da incineração,
ou inumação. Evita que a separação seja abrupta e ameniza a dor. A
presença do tanatopraxista na casa do morto é em geral recebida pelos
familiares como uma ajuda. O filme de Yojiro Takita A Partida, ganhador
do Oscar de produção estrangeira de 2009, é um belíssimo exemplo disso.
A ritualização da morte é necessária porque ninguém a aceita
automaticamente. Queremos vê-la positivamente, como uma transformação. A
ritualização está a serviço dessa transformação. Sem ela, o luto é mais
penoso.
Nós sofremos sem os nossos mortos, mas não podemos viver com eles. O
ritual serve para encontrar a boa distância. Como diz Baudry, grande
estudioso do assunto, temos de evitar a disjunção (a completa negação da
morte) e a confusão (a relação ininterrupta com o morto).
A morte de um ser querido nos faz sofrer. Mas também nos reenvia à nossa
condição de mortais e nos humaniza. Lembra que tudo passa e ensina a
valorizar o presente."
Fonte: GRUPO VILLA
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